Detalhes Escrito por Newton C. Braga
No artigo em que focalizamos a Lei de Moore, ficou claro que toda a tecnologia moderna dos semicondutores está ligada a dois fatores: o tamanho dos elementos que podem ser integrados num chip e a sua quantidade máxima. Para entender como as especificações tão comuns hoje de tecnologia de "tantos mícron", usadas para indicar o processo de fabricação de chips, funcionam é interessante fazermos uma breve revisão do modo como são fabricados os circuitos integrados, ou seja, as tecnologias usadas nos circuitos integrados. Esse é justamente o assunto de nosso artigo.
Obs. Este artigo é de 2001. Novas tecnologias foram desenvolvidas possibilitando cada vez a integração cada vez maior de componentes num chip.
Voltando um Pouco no Tempo
Até 1950, qualquer equipamento eletrônico era formado por componentes individuais (discretos) que deveriam ser fabricados separadamente, cada qual com seu processo específico, e depois montados e interligados numa placa ou chassi comum para formar o circuito desejado.
Tudo isso mudou com a invenção do circuito integrado por John Kilby em 1950, conforme narramos no artigo anterior. A idéia básica de Kilby era de que em lugar de fabricarmos os componentes de um circuito separadamente, para depois interligá-los formando o circuito desejado, poderíamos usar um processo único para fabricar todos os componentes interligados sobre uma pastilha de silício, já formando o circuito desejado.
A ideia floresceu, e os "circuitos integrados" começaram a aparecer.
Partindo dos tipos mais simples, e evolução das tecnologias foi possibilitando a colocação de cada vez maior número de elementos numa pastilha de silício e também a redução cada vez mais acentuada das dimensões desses componentes.
A evolução da tecnologias eletrônicas foi justamente associada à própria evolução do circuito integrado, conforme vimos ao analisarmos a Lei de Moore.
Assim, quando falamos de eletrônica moderna e pretendemos fazer qualquer tipo de previsão o futuro, analisando que tipos de novos dispositivos podem aparecer, devemos sempre estar levando em conta as tecnologias de fabricação dos circuitos integrados.
Dependem justamente dessas tecnologias os novos dispositivos que podem ser criados e a quantidade de componentes que podem ser integrados num único chip.
Para especificar o grau de elaboração de um CI é comum a utilização de dois parâmetros importantes que, na realidade, são interdependentes: a quantidade de componentes que podem ser integrados nos chips e as dimensões mínimas dos detalhes que esses componentes podem ter.
Para entendermos como isso funciona, vamos fazer uma breve revisão dos processos de fabricação dos circuitos integrados.
Fabricando um Circuito Integrado
O processo de fabricação de um circuito integrado envolve basicamente 5 etapas .
O ponto de partida para a fabricação dos circuitos integrados (assim como de outros dispositivos semicondutores como transistores e diodos) é o wafer. Trata-se de um disco de silício cristalino extremamente puro com uma espessura de poucos milímetros.
O diâmetro dos wafers varia de acordo com a tecnologia usada podendo partir de 100 mm (4 polegadas) e indo até 300 mm (12 polegadas).
Num cristal, como o que forma os wafers, os átomos são organizados com uma orientação bem definida. Essa orientação precisa ser levada em conta no processo de fabricação.
Assim, para os wafers de 100, 125 e 300 mm, é feito um corte que serve para indicar o modo como o cristal está orientado. Nos wafers de 200 e 300 mm a marca consiste num pequeno rasgo, conforme mostra a figura 2.
Tipos de wafers usados na fabricação de circuitos integados
Basicamente existem três tipos de wafers: tipo puro que é usado para a fabricação de CIs, Epitaxial (Epi) que é um wafer formado por um cristal único com um filme depositado na sua superfície e Silicon on Insulator (SOI) que consiste num filme de cristal silício depositado num filme isolante sobre o wafer que serve de base.
Quando se analisa as tecnologias usadas na fabricação de circuitos integrados, as dimensões dos elementos são extremamente pequenas. Com freqüência estaremos falando de mícron, nanometros e dimensões até menores. Será importante que o leitor tenha uma idéia dessas dimensões através da tabela seguinte:
Unidade Símbolo Valor comparativo Metro m - Milímetro mm mil milímetros resultam em um metro Micrometro ou mícron ?m um milhão de mícron equivale um metro; mil mícron equivale um milímetro Nanometro nm um bilhão de nanometros equivale a um metro; mil nanometros equivale a um micrometro
Uma ideia aproximada das dimensões de objetos conhecidos pode ajudar o leitor entender quão pequenos podem ser os componentes eletrônicos modernos. A tabela seguinte mostra algumas dimensões:
Objeto Tamanho Aproximado Grão de areia 100 a 1000 ?m Diâmetro de um fio de cabelo 30 a 200 ?m Bactéria 1 a 30 ?m Partícula de fumaça de cigarro 10 nm a 1 ?m Vírus 3 a 40 nm Átomos 0,2 a 0,3 nm
O menor processo de fabricação usado atualmente para os circuitos integrados consegue gravar detalhes de 130 nm (0,13 mícron). No entanto, alguns processos em estudos chegam a 70 nm (0,07 mícron). Podemos dizer que um detalhe com essa ordem de tamanho está bem próximo ao de um vírus grande e é bem menor que uma bactéria!
O passo seguinte é alterar as propriedades de regiões específicas do wafer de modo que se formem os componentes desejados e as trilhas de conexão entre eles.
Esse processo envolve o uso da Fotolitografia.
Gravação de um circuito integrado num wafer.
Na fotolitografia, uma substância química sensível à luz, denominada "photoresist" é espalhada pela superfície do wafer, cobrindo-a na extensão em que se deseja gravar os componentes.
O processo de espalhar essa substância é feito de forma rápida e controlada de modo a se formar um filme uniforme muito fino. Na figura 4 mostramos como isso é conseguido girando-se rapidamente o wafer.
O wafer é girado para que o photoresist se espallhe de maneira uniforme
Depois disso, o wafer passa por um processo de cozimento num forno, depois disso ele exposto à radiação ultravioleta através de uma máscara que possui regiões opacas e transparentes, formando justamente o desenho dos componentes que devem ser gravados.
O uso da radiação ultravioleta é importante, como vimos no artigo sobre a Lei de More, porque seu menor comprimento de onda permite que detalhes com menores dimensões sejam gravados.
Depois de ser exposto à radiação, o wafer passa por um processo de revelação onde as áreas expostas são removidas e as cobertas permanecem. Diversas variações desse processo podem ocorrer nesse ponto da fabricação, mas o importante é que com a revelação, áreas condutoras e isolantes são gravadas no padrão que vai corresponder ao circuito integrado, conforme mostra a figura 5.
As etapas do processo de fotolitografia
De uma forma mais detalhada, podemos dividir o processo de fotolitografia em seis fases:
Cobrir o wafer com uma substância que facilite a adesão do photoresist
Cobrir o wafer com um líquido foto-sensível (photoresist).
Cozer o wafer para secar o photoresist
Expor o wafer a radiação ultravioleta através de uma máscara em que o padrão a ser gravado esteja presente.
Cozer novamente - alguns tipos de photoresist exigem que após a exposição à radiação haja um cozimento para completar as reações químicas que ocorrem.
Revelar o photoresist removendo deixando expostas as áreas que devem ter suas propriedades elétricas alteradas, ou seja, onde devem ser formados componentes.
Recozer o photoresist para estabilizar suas propriedades químicas
A fase seguinte no processo de fabricação é a implantação de íons.
O que cada região sensibilizada vai ser depende das propriedades elétricas que ela vai adquirir. No caso dos semicondutores, isso significa dopar essa região de modo que ela se torne um semicondutor N, P ou mesmo deixá-la sem dopagem para que ela se torne um fio ou uma interligação de componente e até mesmo a armadura de um capacitor.
Essa implantação é feita numa câmara de vácuo. O wafer é ligado a um eletrodo e os íons a serem implantados são acelerados pela tensão do wafer de modo a penetrarem na profundidade desejada, difundindo-se pelo material.
Um ponto importante no processo de fabricação está justamente na possibilidade de se fazer os íons penetrarem exatamente na profundidade desejada e no controle exato da quantidade deles. As impurezas implantadas nesse processo não penetram mais do que uns poucos mícron de profundidade no wafer.
Continuando com o processo de fabricação, além da implantação de íons, diversas substâncias são depositadas na superfície do wafer formando filmes muito finos. Esses filmes, como nitreto de silício, são usados para preservar a camada protegendo-a no final do processo de fabricação. Polisilicon é uma outra substância usada para fabricação de transistores de MOSFETs. Metais como alumínio e cobre também podem ser depositados para formar interligações entre elementos do circuito.
Meios químicos ou físicos são usados para depositar o metal, dependendo da tecnologia e do tipo de componente que está sendo fabricado.
Finalmente, o wafer passa por um banho químico. Diversas tecnologias que vão do simples uso de líquidos até plasma foram desenvolvidas, conforme o tipo de circuito integrado que está sendo fabricado.
Uma forma de banho é feito a seco com o uso de ondas de rádio, microondas de alta energia aplicadas a um gás de modo a torná-lo reativo. Gases que podem ser ionizados resultando em íons de cloro, bromo e flúor são usados em alguns processos.
No final de todas essas etapas, num único wafer podem ser formados muitos circuitos integrados. A quantidade depende justamente das dimensões de cada. Num wafer comum podem ser fabricados mais de 200 circuitos integrados de uma vez.
Evidentemente, a presença de impurezas no próprio material, falhas do processo, fazem que nem todos sejam aproveitados. Assim, antes de se passar ao corte e encapsulamento de cada um dos circuitos integrados, eles passam por um teste de funcionamento.
O resultado final está na figura 6 em que o pequeno chip de silício resultante é soldado aos terminais de ligação e encerrado num invólucro que, ao mesmo tempo que o protege contra a ação dos elementos externos, também serve para dissipar ou transferir o calor gerado no seu processo de funcionamento.
O chip de silício ocupa apenas uma pequena parte do componente que denominamos circuito integrado.
Conclusão
As tecnologias de fabricação dos circuitos integrados têm evoluído no sentido de se poder gravar cada vez detalhes menores nas pastilhas de silício e assim aumentar a densidade dos componentes que podem ser integrados.
Essa capacidade é especificada nas tecnologias existentes e normalmente expressa na forma da medida do menor detalhe que pode ser integrado com definição.
Assim, para s DRAM e para os microprocessadores que representam os componentes que encabeçam toda a eletrônica dos circuitos integrados, passamos de uma escala de integração de 100 mícron em 1970 para menos de 0,18 mícron em nossos dias.
Na figura 7 temos o gráfico que mostra essa evolução das tecnologias de integração.
Menor largura de linha ou trilha integrada versus ano da fabricação.
Conforme já salientamos, saltos tecnológicos podem transpor determinados obstáculos determinados pelas leis da física, como por exemplo, a relação entre o comprimento de onda da radiação usada no processo de litografia e o menor objeto que pode ser integrado.
O uso de radiação ultravioleta de comprimentos de onda cada vez menor pode nos levar a tecnologias muito menores do que as dos 0,07 mícron previstas para os próximos anos, com uma capacidade de integração de componentes que poderá facilmente superar a escala dos terabits para as memórias.
O que precisamos aprender é que mesmo que as leis da física sejam válidas, nunca podemos dar como definitiva qualquer conclusão que chegamos, pois saltos tecnológicos e descobertas não previstas podem mudar tudo.
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